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Adulterações na Cadeia Produtiva do Leite

A portaria 146/96 do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) define que leite é o produto obtido da ordenha completa e ininterrupta em condições de higiene, de vacas leiteiras sãs, bem alimentadas e em repouso. Ainda segundo essa portaria, não se admite nenhum tipo de aditivo ou coadjuvante no leite fluido a granel de uso industrial (leite com destino de processamento e não de consumo direto), já para o leite UHT, permite-se apenas uso dos estabilizantes sódio (mono, di ou tri fosfato), separados ou em combinação em uma quantidade não superior a 0,1 g/100 mL.


Então antes de entendermos o que é um leite fraudado...

Você sabe a importância econômica da indústria de lácteos para o Brasil?

        Embora ao longo de 2017 a economia brasileira siga com expectativas pouco animadoras e com projeção de crescimento de 0,3% segundo o Fundo Monetário internacional (FMI), no primeiro semestre, a cadeia da bovinocultura leiteira registrou crescimento de 4,36% em relação ao mesmo período do ano anterior e com isso sua renda saltou para R$ 69,4 bilhões.

Figura 1 – Variação de renda das cadeias no 1º semestre de 2017
Fonte: Cepea-USP e CNA (2017)

Figura 2 - PIB do agronegócio da cadeia de leite – de 2001 a 2017 (R$ milhões)
Fonte: Cepea-USP e CNA (2017)

Sem mais delongas, o que o leite “necessita” para ser considerado produto fraudado?

      Leite fraudado, adulterado ou falsificado é aquele que sofreu algum tipo subtração dos seus componentes ou foi adicionado de substâncias conservadoras ou de quaisquer elementos estranhos à sua composição natural.

Como ocorrem essas adulterações?

        Geralmente uma prática vem acompanhada de outra, porque a adulteração necessita de uma ação corretiva para que o produto passe desapercebido pela fiscalização. Segundo Pereira (2013) a porcentagem de fraude é de 10% em relação a produção total, mas não são dados precisos.


Fonte: Food Safety Brazil (2013)

Adição de água

            É usada para aumentar volume do leite e acarreta em anormalidades entre o ponto de congelamento e a densidade do leite.

O que é feito para que o aumento de volume não seja percebido?

             São adicionadas substâncias para reconstituir o valor nutricional do leite. Sal, açúcar, álcool e citrato são exemplos de substâncias que diminuem o ponto de congelamento, já para o disfarce da densidade é usado substâncias que contenham amido para chegar à valores semelhantes ao do leite sem fraude. Esse tipo de fraude também prejudica a qualidade microbiológica do leite, pois a maioria dos fraudadores adiciona água não tratada no leite.

Fonte: ALPINO (2017)

              No início de 2013 foi desencadeada pelo Ministério Público a “Operação Leite Compensado” com o objetivo de coibir a fraude em leite cru que era realizado por um grupo de transportadores do interior do Rio Grande do Sul com adição de água e ureia.
               A ureia servia para recompor a composição proteica do leite que foi diluída durante a aguagem e era de difícil detecção pois é um componente natural do leite. O principal problema é que a ureia utilizada para esse tipo de fraude é de origem agrícola, a mesma utilizada como fertilizante, leva em sua composição o formol, que atua como conservante composto e é extremamente tóxico e cancerígeno segundo à Agência Internacional para Pesquisa sobre Câncer e a Organização Mundial de Saúde (OMS).
              Para saber mais sobre os perigos causados pelo formol, acesse o boletim informativo do Centro de Estudos em Toxicologia da Universidade Federal do Ceará clicando aqui.

E então, o que é feito para disfarçar a má qualidade microbiológica causada pela adição de água não tratada?

Adição de conservadores

              Adicionados ao leite com o objetivo de prolongar sua "vida útil" através da inibição do crescimento microbiano. Exemplos clássicos são o uso do famoso formol (substância tóxica e carcinogênica) e água oxigenada.

Como os fraudadores conseguem mascarar a presença desses conservadores?

             São utilizadas substâncias chamadas de neutralizantes. Elas são adicionadas ao leite juntamente com os conservadores para mascarar possíveis alterações de acidez causada pela produção de ácido lático das bactérias. Entre as substâncias está a popularmente conhecida soda caustica, cal e bicarbonato de sódio. Todas elevam o pH mas não tem nenhum efeito bactericida.


Fonte: Food Safety Brazil (2007)

         Em 2007 a operação “Ouro Branco” realizada em duas cooperativas de laticínios no estado de Minas Gerais, constatou adulteração de leite com a adição de soro de leite, peróxido de hidrogênio e hidróxido de sódio para diminuir a acidez e prolongar a conservação do leite. A cada 100 mil litros de leites as cooperativas ganhavam 10 mil litros. Em 2014, cooperados da Parmalat informaram que todo o leite UHT da empresa continha soda cáustica e água oxigenada. O MAPA realizou diversos testes e não detectou a disseminação do problema – mas dois lotes foram recolhidos. A investigação comprovou que a contaminação ocorreu em dois fornecedores de Minas Gerais, onde foram descobertas diversas irregularidades. Outras marcas também foram prejudicadas, mas apenas a Parmalat precisou realizar um forte trabalho de recuperação de imagem pelos danos causados.
            Além das operações Ouro Branco e Leite Compensado, em 2014 ocorreu a operação “Leite Adulterado” em Santa Catarina. O leite era adulterado tanto antes de chegar nos laticínios como depois de sair do posto de resfriamento e seguia para industrialização em outros estabelecimentos. Os vídeos a seguir mostram detalhadamente como ocorreu a operação que constatou a participação de 14 empresas entre transportadoras e laticínios, todas foram fechadas.



Quais são as formas de impedir que as fraudes ocorram?

         A única forma de impedir que um leite fraudado seja comercializado é realizando análises de rotina do leite. A fiscalização na cadeia produtiva deve ser realizada em três momentos:
- Coleta do leite: o responsável pelo transporte deve verificar na propriedade fornecedora se há não conformidades;
- Recepção do leite na indústria: realizar testes de plataforma para identificar anormalidades que não seriam possíveis de serem identificadas pelo transportador;
- Serviço de Inspeção Federal (SIF): acompanhar o trabalho de inspeção das indústrias e realizar os testes no leite cru e no produto pronto para verificar se a empresa está realizando seu trabalho corretamente.
            O vídeo a seguir explica essa cadeia de inspeção detalhadamente:



E quais são os testes necessários para verificar a integridade do leite?

Análises que a indústria precisa fazer diariamente, para receber o leite:
          Temperatura; teste do alizarol, acidez titulável, densidade, crioscopia, pesquisa de fosfatase alcalina e de peroxidase, pesquisa de conservantes e neutralizantes da acidez, pesquisa de resíduos de detergentes e sanitizantes, pesquisa de reconstituintes da densidade, glícidios redutores em lactose, teor de sólidos totais do leite, teor de gordura e outras pesquisas de aplicação periódica (pesquisa de antibióticos, etc) ou de acordo com suspeitas.
             Recentemente, pesquisadores do Departamento de Química da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) conseguiram desenvolver um novo método identificar e quantificar os principais adulterantes, em diferentes concentrações, como água, peróxido de hidrogênio (água oxigenada), soro, leite e urina sintéticos, ureia e soda cáustica. O método consiste em escanear o produto e enviar a imagem para um software que compara com imagens de adulterações já armazenadas, como mostra o esquema a seguir.

Fonte: FAPESP (2018)

Quem define os parâmetros de qualidade para considerar o produto apto ao consumo?

          O MAPA (Ministério da Agriculta, Pecuária e Abastecimento) regulamentou a instrução normativa IN62/2011 que estabelece normas técnicas de produção, identidade e qualidade de leite bovino, o RIISPOA (Regulamento de Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal) que explica como a inspeção deve ser executada e a instrução normativa IN68/2006 que define os métodos analíticos físico-químicos oficiais para leite e produtos lácteos.

O que acontece com quem é pego fraudando leite?

           As fraudes são práticas antigas e desde 1940 existe uma legislação para punir aqueles são pegos nas fiscalizações, a pena é definida pelo Artigo 272 do Decreto Lei 2.848/1940. A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 8 (oito) anos e multa.
         Fraude é crime e representa risco à saúde do consumidor. A qualidade do leite consumido no Brasil é uma constante preocupação das autoridades ligadas às áreas de laticínios, devido à sua importância na dieta humana. Por isso, é preciso aperfeiçoar os métodos de detecção de fraudes hoje já empregados e garantir que haja um rígido acompanhamento dos produtos e laticínios, além de verificar a autenticidade dos resultados.

Autores: Jenisson Gonçalves, Alexia Nascimento e Carolina Arôxa.

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